flor da cana do brejo

sexta-feira, 5 de abril de 2019

GUIA DE PACOBAÍBA




                                              GUIA DE PACOBAÍBA




GUIA DE PACOPAÍBA

Entrelaçada malha de ferros esculpidos pelas águas.
Estrada de ferro que não parte de lugar nenhum,
Nasce no mar para os viajantes embarcarem
No trem que segue sozinho, o apito ao longe do que foi.

Guia de Pacobaíba é um silêncio só:
Nossos passos escutam o ruído das garças paradas
A espera dos peixes, prata no mar salgado.
Tudo é pausa na música de outrora.

Barcos descansam ao longe, crianças brincam nas margens,
Uns olham, outros dormem, a vida repousa.
Só tua mão é movimento na minha
A guiar o leme dos nossos olhos


(Lúcia Gomes - para João António Vieira - todos os direitos direitos reservados)





Foto: Lúcia Gomes
Guia de Pacobaíba - Inhomirim.

quinta-feira, 4 de abril de 2019

PRIMAVERA


                                           PRIMAVERA


Estou a procurar-me pela casa, entre as coisas, entre:
a porta entreaberta
é partida sempre

A procurar-me estou
nos versos que rabisco no caderno
dormente mão a afagar folhas
sem forças para descobertas

Coberta estou pelo véu da dúvida
a conduzir passos incertos
caminhos de rastros eu tateio
mesmo sem sentir o que rastreio

Afago as flores pela madrugada
compartilho olhares e perfume
espero o dia acordada em sol:
cores da primavera em minha vida.




Foto: Lúcia Gomes






ABRAÇOS



                                                                 ABRAÇOS



Quando o sono bate assim forte,
noite avançada, madrugada por chegar.
Atiro-me na cama, como em seus braços,
estico-me toda a espreguiçar-me..

Alcanço as asas do meu próprio voo

Depois a cabeça, no travesseiro recostada,
o livro ao lado a esperar por mim.
Dou para pensar na vida,
falando coisas, desejando ouvir.

Cochichos de amor soprados ao ouvido

O livro, com as páginas abertas,
o mesmo parágrafo lido varias vezes,
as letras embaralhando viram traços,
até desfazerem-se num borrão.

Baton espalhado no lençol


Foto: Lúcia Gomes

A ESPERA


                                         A ESPERA




Sento-me na espreguiçadeira de madeira e couro
comprada antes da feira de Ipanema virar designer
publicada em jornal e circular como ideia única
projetos de arquitetura de outrem.

Recosto a cabeça nas almofadas de filó,
produto de mãos caprichosas, sabedoras de pontos e nós
onde reclino cansada dos dias iguais em demora
a passar pela janela das flores desabrochando

Olhares inquietos ao perceber a vida florescendo
derramando em cascatas de verde pela parede
abaixo do peitoril branco, lavado, cheirando a água
terra molhada e matizes de branco e rosa.

O teto com o lustre rachado, desenha o risco da luz
refletida nos móveis, os mesmos vindos comigo
em viagem de mudança para junto das matas e mar
sabiás fazendo ninhos e piando ao despertar.



Foto: Lúcia Gomes

Percurso



                                                  Percurso




Como compreender o que dentro de mim vai,
a vida a me levar pela mão
enquanto procuro um jeito
de tomar o rumo e guiar meus passos?

Só dentro de mim o bater do peito
marca cada palavra e a sonoridade
ouvida no calor da pele:
gotas saindo pelos poros.

Dentro de mim um vazio profundo
transborda pelo espaço afora,
encharcando além do que em mim
é possível habitar.





Foto: Lúcia Gomes
Mirante do Rato Molhado - Santa Teresa

NAUS






NAUS

Tua mão toca a minha para que o sono chegue
a riscar versos nos seios ou contá-los ao travesseiro.
É em ti que meu amor arde sem cerimônia ou recato:
pernas entrelaçadas e esse jeito de acariciar os pés
nos passos noturnos e danças diurnas. 
Vives a acender candeeiros para iluminar os meus sonhos: 
olhos abertos a espiar-te.
A palavra soa por dentro do teu sotaque
onde navegam naus portuguesas nas águas do poema.




(Lúcia Gomes - para João António Vieira)


Foto: Lúcia Gomes
Exposição Rio Oitocentista

O CANTO



O CANTO


Talvez um dia eu possa adormecer
crendo que a vida se renova
como uma vez você escreveu.

Hoje não é possível
encontrar vida.

Meu sangue e minha carne
geraram o teu corpo
dentro do meu multiplicado.

Agora o meu ventre
magro e vazio.

Meu peito dói tanto
a garganta se fecha
a voz não sai.

O maestro do coral
manda eu soltar a voz.

Eu não consigo,
canto para dentro
engolindo a minha dor.

(Lúcia Gomes - todos os direitos reservados - do livro POEMAS PARA PEDRO - MEU AMOR).
Foto: Lúcia Gomes
Flor da árvore Abricó de Macaco