flor da cana do brejo

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

PÉTALAS

Pétalas


As damas da noite nasceram
nesta madrugada de perfumes
e silêncio

Outras flores ensaiam
o despertar
no meu corpo

Rara a orquídea
que amo
desabrochou

As estrelas iluminam
o lençol desalinhado
sobre as pernas

As pétalas se movem
coloridas

Pintando o sete

Pintaram o sete os pássaros na tela azul do céu
Doze, exatamente o fizeram.
Nove em diagonal, completaram os da horizontal.
Eu fotografava sem ver o milagre.


quarta-feira, 12 de novembro de 2014

POEMAS PARA PEDRO - MEU AMOR

Meu riso nunca mais será o mesmo
Meu sorriso ficou na tua boca
Minha boca silenciou
Agora minha boca muda
Digita em silêncio as palavras
As palavras saem no teclado
Sem música
 

domingo, 23 de março de 2014

POEMAS PARA PEDRO - MEU AMOR (segundo livro)


Estou triste como árvore antiga

Cujos galhos tombaram ao temporal

Chego a sentir o cheiro da mata

O lago que defronte ondula

A espelhar minha nova forma

Debruçando-me sobre o solo umedecido


Procuro pensar que destes galhos

Caídos sobre o chão molhado

Surgirão novas mudas de mim mesma

Verdejantes e pequenas, inocentes

A crescerem em direção à luz

Tomando o jeito de viverem


O lago guarda os peixes e tem lírios

Parece um fino tecido ao vento

Já foi soterrado em outras chuvas

Cobriu-se de lama barrenta

Seus habitantes foram com a enxurrada

Hoje resplandece ao sol nascente


Procuro aprender com a natureza

A sobreviver aos temporais

Observo o voo do pássaro, sem medo

As folhas que se dobram sem enfrentar o vento

O colibri colhendo o néctar de flor em flor

Até a nuvens no céu mudam de cor
Foto: Lúcia Gomes
Jardim Botânico - Rio de Janeiro - RJ

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014


AUSÊNCIAS





Rio de Janeiro, 25 de dezembro de 2010



É Natal. Nos lares as árvores cintilam , adultos e crianças abrem presentes, risadas são ouvidas no burburinho da sala. Não aqui. O silêncio acompanha o piado dos pássaros na árvore: quebrada eu a reconstruí com orquídeas, samambaias e ninhos que admirei em manhãs claras, serenas.

Já é tão tarde que na cama as crianças se recolhem esperando as chaminés da Europa, onde um presente cairá sem ser queimado pela lareira. Um presente esperto, capaz de saltar o fogo. Eu não penso em lareiras, nem em neves, tão pouco em presentes. Só sinto a ausência que se faz: cruel como o falar entre dentes.

Hoje, aqui com meus cachorros, a escutar o vozerio das matas da Gávea, sei o quanto sou a companhia que me resta. Anos bordei historias entre risos, coleções de linhas coloridas, renovadas no tear das minha mãos. Tantas páginas virei, permeadas de figuras para provocar risadas. Tantos desenhos fiz, permeados de palavras para encantar as falas. Tantos. Onde estão? Eu os acho, leio e me espanto de somente eu lembrar-me.

Dizem que tudo isso passará. Há coisas que não é possível esticar demais: arrebenta ou laceia. Difícil explicar a quem nunca cuidou do outro. Eu, que pouco olhei para mim,agora me procuro no que não tenho. Como dói.

Quando eu não derrubo as coisas, fruto das mãos cansadas, as coisas desabam sobre mim: grito de lembranças para que eu não esqueça. Por que só eu me lembro? Por que insistem em passar uma borracha? O papel não ficará branco, apenas borrado.

É difícil tirar a veste da alma e desnudar-se diante do improvável. Ninguém espera. Mais fácil seguir enrolada nas pashiminas indianas a cobrir-me com cores diversas. Horas há em que envolvo o rosto. Somente os olhos claros, verdes, a espiar. Inacreditável. Transformo-me em vestes. Meu corpo não pode ser visto. Minha alma é um segredo sagrado. O céu não permite revelá-lo. Sinto necessidade de agasalhar-me. Roubaram-me tudo.

Tudo é estranho. Volto o olhar para o infinito. Minha vista alcança detalhes. Coisas que vejo e a ninguém interessa. As pequenas silhuetas me atraem. Contornos: fios modelam meu olhar. Minha memória carrega muitas vidas. Outras vidas na minha vida. Multiplico-me em vozes, cheiros, paladares, a mão que tento alcançar.

Alto é o muro. A escalada requer mais sabedoria do que cuidado. A hera faz seu trabalho. As trepadeiras derramam-se sobre as copas das árvores.As flores azuis colorem o verde.

Ver de perto para crer. Será possível?

A mesa grande está posta. A toalha bordada estendida. Os pratos nos locais de cada um. Os candelabros iluminam:

Ausências



  



Mariana e Bernardo com sorrisos e beijos
Foto: Lúcia Gomes
Jardim da Aclimação - São Paulo

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Palavras Cruzadas


Palavras Cruzadas
 
 
                                                                                                   Lúcia Gomes

Vamos escrever a nossa historia, enquanto ainda vive na memoria?

Ah, não me falem de rimas pobres. Essa não é a questão, de novo não.

Li o e-mail a indagar-me o porquê de tal proposta. Escrever dizem ser um ato solitario. O mundo está cheio de mentiras. Meus personagens me atazanam as ideias e falam mais do que eu.

Quatro mãos juntas ao piano a dedilhar uma canção nova para cantarmos nos momentos de silencio e quebrarmos a rotina. Minhas duas mãos poderão tocar as suas. É quase inevitavel. Nesse momento nossas palavras entrelaçadas soariam a mesma nota: um sol qualquer. Nossos risos esbarrariam no calor dos labios. Possivelmente todos os teclados tocariam ao mesmo tempo a nossa música.

Posso até ouvir meu coração acelerado,você de maestro a reger. Não sei como realizar tal proposta separados pela tecnologia a furtar-me o que mais preciso: o roçar dos seus braços nos meus. Também esse cheiro que não me pertence e muda o ar do quarto. Ou as mãos, uma sobre a outra,os dedos apertados a segurar para que não partam. Bom esse aconchego. A certeza, mesmo que provisoria, da sua proteção. O calor que sobe pelo braço e arrepia o pescoço. Suspendo o ombro, reviro as costas, sei que você vai afastar os meus cabelos castanhos e longos a divertir-se com o meu riso: Assim não vale! Você já saberia a resposta e riria do lugar comum. O comum, às vezes, é tão melhor.

Bom e gostoso. Coloquei o capuccino fumegante na caneca de cerâmica. As mãos quentinhas desacostumadas a esse inverno. Encostei-me na porta da cozinha a olhar as maitacas empoleiradas nas telhas. Um bando inteiro. A empregada da vizinha gritava: “Milagre! Milagre! Só pode ser um sinal de Deus.” Lindas de fato. O seu cantar é atraente: todas ao mesmo tempo num delirio humano de deixa eu terminar de falar. Procurava aprender com elas.Um trinado em conjunto. Arruaça logo de manhã. Eu o empurrava para lá dizendo Pára, agora não, deixa eu espreguiçar-me. Você com essa mania de alongar-me e eu, doida para ficar agarrada ao travesseiro, puxava o lençol para cobrir-me. Inútil: queda de braço vencida.

Você venceu. Dei-me por vencida. Sei lá. Pouco importa. Agora minha boca tem gosto de chocolate, afrodisíaco natural, acalma, esquenta, abraço apertado gostoso. Assim, aquecida, fica mais fácil entender o seu desejo. Gosto de aceitar desafios. Como faremos? Não diga. Será mais divertido procurarmos juntos o caminho. Eu reparo até nas nuances dos tons de verde das folhas. O que mais chama a atenção é a riqueza de detalhes. Isso é observação sua, não minha. Talvez. A você falta certas sutilezas com as palavras. Certa vez confessou-me isso, sem segredo, apenas um sou assim. Teremos que encontrar harmonia nas nossas diferenças. A tampa certa da panela. Qualquer coisa que dê samba ou outro ritmo. O seu caminhar é ligeiro. Gosto de parar e aspirar a brisa. Assim vamos acertando os passos. O descompasso não combina com a gente.

Nossos passos se encontraram de uma maneira tão engraçada. Não posso dizer que tropecei em você. Marcamos um encontro: isso sim. Primeiro deixamos a escrita aproximar-nos. Depois a troca de olhares numa manhã ensolarada. Eu desviando a atenção para o mar, falando de barcos navios, caravelas. Quase contei a Descoberta do Brasil por inteiro, com todos os detalhes, incluindo a receita indígena de como assar um português. Que pânico! Você me encarando e rindo. Daí vieram suas historias. Eu as ouvi, mesmo as que não contou. Sei serenar a alma, ficar em silencio, calma, só para ver o que me escondes, só para ler o que não escreves, só para perceber os gestos.

Que gesto é esse? Os braços cruzados, os olhos controlando quem sai e entra de um lugar público. Estava tão escuro. O filme não havia começado. O barulho do amendoim misturado aos ruidosos passos procurando lugares. Trancado no seu mundo, só via além. Os vultos misturados aos risos pareciam não pertencer a nossa historia. Nem que eu estivesse no seu colo você perceberia a minha presença. Senti-me tão sozinha aquele dia. Será que você percebeu? Que pensamento passa nos seus olhos?

Meus olhos espiam o seu jeito: doce, serio,companheiro,distante, o encontro no desencontro. Você sapecou um beijo quando eu menos esperava e fiquei ruborizada. Ainda possuo essas graças: coisa de menina. Acenei sem jeito. Não olhei para trás. O metrô em velocidade sacudia todas as minhas ideias. Sua boca ainda seguia comigo. Os labios quentes. As mãos geladas. Entrei na rua onde moro. Protegida pelas frondosas árvores podia esconder-me de mim. A pashimina lilás, que tanto gosto, envolvia-me no abraço ausente. O barulho da chave destrancava a porta. Agora as portas se abriam e eu precisava dar-lhe uma resposta.

Minhas mãos atenderão a seu desejo. Junto com as suas teclaremos a nossa historia.



Abandonei-me em seus abraços, repousando minha cabeça de cansaços, para que nesta madrugada, de chuvas espirrando na janela, eu possa adormecer, acolhida em seus braços. E se seus dedos entreabrem os meus labios, buscando palavras ali guardadas, a buscá-las entre a língua repousada, entrelaçando-as numa só linguagem; eu me deleito em deixar-me aquecida, assim coberta pela mão querida, que me governa e me desgoverna, permitindo-me falar pelos sentidos.




Foto: Lúcia Gomes
Pontes sobre o mangue 

sábado, 6 de julho de 2013

O Sabiá na Telha

Foto tirada por Lúcia Gomes
Gávea - Rio de Janeiro

 
 


O sabiá ainda canta nas manhãs da nossa casa:
voa, cata sementes, faz ninhos, vigia e espera...

Eu também ainda canto as músicas que tu gostas:
voo, cato o alimento, organizo, vigio e espero...

Agora dei pra criar asas: posso estar em qualquer árvore