BEIJOS DE ESPERA
Cadê você? Você quer um
beijo por telefone? Posso ligar para dar Boa Noite? Estou esperando... Onde você está?
É tão curioso e inusitado começar a corresponder-se
com alguém sem nunca ter visto o seu rosto, sem saber o som da sua voz ou o
cheiro que emana do seu corpo. Talvez este ar de segredo é que tenha me
atraído. Assim, sem perceber, fui me despindo diante de você. Rendi-me e
mergulhei no desconhecido sem procurar entender. Engravidei só das intenções,
por lhe querer.
Você mexe comigo de uma tal maneira e me toca sem me
dar tempo de eu fugir de mim mesma, enfiar-me nos lençóis, cobrir a cabeça,
espiá-lo escondida, criança travessa.
Minha querida, você está por aí? Já estou
aqui. Beijos de chegança.
Tudo tão novo. Você foi chegando e eu não hesitei. Imediatamente
me arrisquei diante desta alegre surpresa. Fui logo respondendo.
Antes
que você comece a fazer o interrogatório, lá vai. Estou de bermuda e camiseta
regata vermelha. A camisola branca, que você vive falando, não é sensual. Ela
tem preguinhas, rendinhas, alcinhas e vai até o joelho. Parece mais camisolinha
de criança. Beijos de sem roupa.
Minha anjinha
querida, queridíssima, estou reparando que você hoje está mais sensual, mais
provocante e provocativa. Você foi logo se antecipando a mim. E se eu quisesse
falar de pureza, de religião, do meu possível exílio num monastério, de coisas
inocentes como sua camisolinha transparente? Beijos pelados.
As mãos deslizavam rapidamente sobre o teclado. As
páginas corriam numa velocidade estonteante. Nos embolávamos na ânsia de falar,
de estarmos juntos como podíamos. Nossas palavras se misturavam. Cheguei a ler
em você o que havia escrito em mim. Você conseguiu ocupar comigo o mesmo
espaço, os mesmos versos, descobrindo-me sem me dar tempo de guardar a minha
alma debaixo do travesseiro.
Se eu lhe der
tempo, tudo se esvairá. No amor não se dá tempo. Sem antes, nem depois. Você se
despe, se mostra doce e inteira. Agora sim, nesse momento posso ver sua alma,
pronta para me receber. Saindo agora do forno. Beijos quentes.
Estourou um trovão imenso aqui. O quarto ficou azul.
Você
me inspira, um sentimento bom nasce dentro de mim e vem o que de melhor está
guardado, flui de maneira leve, minhas mãos e minhas ideias deslizam
simplesmente, sem retoques. Por isto eu te amo, porque você chama o meu lado
mais belo e eu respondo.
A chuva está caindo. A casa em silêncio. As paredes
escutam cúmplices. Apenas nossas palavras sabem o segredo.
Quando o relâmpago espocou cruzando o céu em faíscas,
o quarto azul acendeu em respingos de chuva. A luz apagou.
Minhas mãos tateavam a procura do celular no meu colo.
Enviei a mensagem.
Tive que parar no meio de um sorriso.
Não tem problema, eu completo.
(Lúcia Gomes - direitos reservados)
( conto escrito em 7/04/2010)